No
último dia das crianças fomos chocados com a notícia da morte do garoto Enilson
Alves de Souza, de apenas 12 anos. Mais uma morte colocada na conta das drogas,
como se fossem realmente as drogas que tivessem matado o garoto. Esse tipo de
conclusão superficial é um desrespeito à memória de todos que tiveram sua morte
explicada dessa maneira, pois quando se demoniza uma substância como se faz com
as drogas ilícitas, cria-se um mostro intangível muito difícil de ser
combatido.
De
fato, não é esse monstro alimentado de medo que ceifa a vida de tantas pessoas.
Essas mortes são consequências da política de proibição à algumas substâncias,
conhecidas como drogas ilícitas, adotada por tantos países como o Brasil.
Desde
sempre o ser humano consome drogas que alteram o funcionamento de seu Sistema
Nervoso Central. Durante toda a história da humanidade essas drogas serviram a
vários fins: transcendência religiosa, usos recreativos, manutenção da atenção
e do estado de vigília, e, desde o mercantilismo sempre esteve cercada de
grande interesse comercial. Somente no fim do século XIX, com o advento da
farmacologia industrial revolucionando a medicina e cerceada por vários fatores
econômicos e culturais, algumas dessas drogas, que eram amplamente consumidas,
passaram a ser proibidas. Surgiu a diferença entre fármaco, drogas lícitas e
drogas ilícitas.
Só
que a proibição não faz com que as pessoas parem de querer consumir drogas.
Pelo contrário, para alguns, em especial os jovens, aquilo que é proibido passa
a ser muito mais sedutor. Um exemplo interessante dos efeitos nocivos da
proibição aconteceu na década de 20 nos EUA, com a Lei Seca. Apesar de
proibido, ainda existia uma grande demanda de consumo do álcool. Sem
fiscalização de qualidade ou taxação de impostos, criminosos como Al Capone
dominaram essa fatia de mercado pela força, aumentando os índices de violência
e ficaram muito ricos às custas de uma brecha do Estado. Depois de cerca de 10
anos de Lei Seca, quando o consumo de álcool voltou a ser permitido, as taxas
de criminalidade caíram para os índices de antes da proibição.
Recentemente
estudos mostraram que a maior parte dos detentos que lotam as penitenciárias de
todo o Brasil estão presos por crimes relacionados ao tráfico de drogas. A
proibição inventou o tráfico, e este segue as próprias leis, regulando-se por
meio da violência e alimentando uma rede de investimentos mal feitos de combate
e repressão ao uso e comercialização de drogas. Promete-se muito mais repressão
como combate à criminalidade e isso significa mais e mais investimentos pouco
eficazes. Investimentos que poderiam estar sendo feitos na educação ou na
saúde, melhorando, por exemplo, a situação dos CAPS (Centro de Atenção
Psicossocial) de Goiânia, como o que o menino Enilson frequentava. Os CAPS são
as melhores alternativas para o tratamento de uso problemático de drogas, mas
sem investimentos, não podem realizar um bom trabalho. É esse descaso que mata
mais que as drogas, porque todos nós somos potencias vítimas dele.
Fernando Reis é Psicanalista e mestre em
Psicologia Social.
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